quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Não é a cara do Estadão?

Por Daniela


Quando o leitor se depara com o título “Preconceito com estrangeiro” do Editorial do Estadão de hoje (leia aqui) pode achar que vai ler algo novo sobre as últimas operações do presidente da França, Sarkozy, que vem sendo sistematicamente criticado por agir de forma discriminatória com os estrangeiros imigrantes, deportando os ciganos do país, ele próprio, filho de imigrantes, húngaros, mas. Imigrantes, porém nobres. Bem diferentes daqueles que estão removendo de “suas terras”.


Eis que o assunto é outro e logo se revela de quais estrangeiros o jornal está falando: não é dos oprimidos a que o distinto jornal se referia, mas daqueles que têm poder de compra de propriedades e empresas no Brasil.

Questões polêmicas à parte que podem e devem ser discutidas, a síntese que o jornalão fez do tema foge ao próprio tema e volta a bater numa daquelas teclas que falamos ontem. A opinião do jornal é aquela ginástica para encontrar problema e defeito no governo Lula e na candidata do governo. Realmente essa ginástica está cada vez mais evidente. (Clique aqui e veja uma edição estupenda sobre o assunto).  
 
Continuando a leitura vemos que, na verdade, o texto também não se trata de discutir a situação das empresas brasileiras que são controladas por estrangeiros, ou refletir porque os estrangeiros ricos teriam direito à terra no Brasil, mas se trata de fazer uma insinuação sobre a relação da Dilma com o MST. O mesmo assunto que foi abordado no jingle da coligação “Brasil pode mais” que ouvi hoje de manhã. Acho que nem preciso reiterar quão desrespeitoso é o jingle... Coligação “Brasil pode mais” e o Estadão: “tudo a ver”.


Como não conseguem diminuir a rejeição de mais de 40% do eleitorado em relação a Serra, e como já viram que quanto mais baterem na candidata Dilma, mais ela vai ganhar votos, resolveram dar uma ajuda para o candidato falar mal do que ela teria feito de errado quando estava no comando da Casa Civil:


"No início do segundo mandato de Lula, no entanto, a Casa Civil, chefiada pela hoje candidata do PT à Presidência, Dilma Rousseff, tomou a iniciativa de reabrir a discussão da compra de terras por estrangeiros. As conclusões dessa discussão, preparadas pelo consultor-geral da União, Ronaldo Jorge Araújo Vieira Jr., foram enviadas à AGU (Advocacia-Geral da União) em setembro de 2008.


Só dois anos depois e faltando pouco mais de um mês para as eleições, o advogado-geral, Luís Inácio Lucena Adams, as desengavetou e encaminhou ao presidente da República, recomendando a aprovação. No dia em que recebeu a documentação da AGU, o presidente aprovou o parecer, demonstrando sua pressa em decidir sobre uma questão que tem muito mais interesse político do que econômico."

O jornal vai construindo o fato de modo a levar a entender que as razões dos personagens citados são duvidosas: "Estranhas são também as razões do governo". Para não deixar o leitor na mão o jornal explica quais seriam essas estranhas razões:

"Em resumo, a medida atende aos interesses políticos dos que defendem a reforma agrária, como os membros do MST, e dos que, em nome da preservação de nações indígenas, querem controlar a propriedade de terra em determinadas regiões. Não é do interesse do País."

Segundo o jornal, o Incra “age sob o estímulo de organizações clandestinas, como o MST”. Confesso que li e reli a frase umas 5 vezes achando que não estava entendendo. Mas é isso mesmo: para o Estadão o MST é uma “organização clandestina” e os povos indígenas (leia-se: estrangeiros pobres) são usados por terceiros (oh, quem seriam esses malfeitores?).

Quem quer “controlar a propriedade de terra em determinadas regiões”? Gostaria que o jornal me dissesse, se o Estado brasileiro, sempre representado por um governo, não tiver o poder de “controlar a propriedade de terra em determinadas regiões” quem terá? A velha mídia? A ultradireita do país que ela representa? Pela afirmação “Não é do interesse do País” deve ser a proposta do jornaleco. Quem esse jornal representa para poder fazer essa afirmação? 85% da população brasileira? É, a ultradireita que morre de medo da reforma agrária também é a cara do Estadão. Eles também têm “tudo a ver”.

Estranhas, muito estranhas mesmo, são as ginásticas da velha mídia para conseguir criticar os políticos mais competentes que este país já conheceu.

4 comentários:

  1. Daniela,
    o problema não é bem o MST,veja que publiquei na DBO Agrotecnologia a seguinte notícia na mais recente edição (nº 26):
    "Sinal vermelho para venda
    de terras a estrangeiros
    O avanço estrangeiro sobre terras brasileiras vai ser brecado pelo presidente Lula, que vai propor mudanças na Constituição para proibir a compra de nossas terras por não brasileiros.
    A terra tem uma função social e estratégica em termos de produção de riquezas e alimentos e não há no momento nenhuma necessidade de autorização para a compra de imóveis rurais em território brasileiro e nem limites claros para a sua extensão.
    Com isso, houve uma invasão estrangeira no Brasil e dados do cadastro rural de 2008 mostram 4,04 milhões de ha registrados por estrangeiros, área equivalente ao Estado do Rio de Janeiro.
    O capital vem para especular com a terra e gerar lucros. Segundo levantamento da ONG espanhola Grain, um quarto dos 120 principais investidores corporativos globais já tem presença no território brasileiro.
    A maior concentração do capital estrangeiro em terras no Brasil está no Centro-Oeste, onde 844 mil ha já estão nas mãos de transnacionais.
    A ideia do governo é proibir totalmente a compra de terra por estrangeiros e até anular títulos já registrados por estrangeiros a partir de uma determinada data a ser estabelecida.
    A função social da terra, que inclui o aproveitamento racional e adequado dos recursos naturais, a preservação do meio ambiente e a observância das disposições que regulam as relações de trabalho, deve estar sempre à frente de qualquer relação de propriedade."

    Os gringos compram terras por aqui no Brasil, que custam 10% do valor deles na Europa ou nos EUA; e enquanto isso a China está "invadindo" a África. Já compraram por lá mais de 35 milhões de hectares, o que equivale quase a área que se planta de soja no Brasil...

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  2. oi Richard,

    obrigada pelo comentário. Claro, a questão não é o MST, essa é a questão que o Estadão arrumou pra botar medo da Dilma...

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  3. O jingle tocou de novo, não sei como a lei permite... Ele diz (vou colocar aqui para não dar cartaz): "A Dilma sem patrão, aí que eu quero ver, os radicais, o Zé Dirceu mais o MST. Toc toc toc, bate na medeia, Dilma sem o Lula, nem de brincadeira." Não é o mesmo discurso do Editorial do Estadão de Hoje e do Jornal da Globo ontem para a Dilma?

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  4. O MST não é chamado de candestino por acaso. Também não é por acaso que a reforma agrária é referida como uma maneira de distribuir terras a vagabundos. Afinal, ambos estão vinculados. A demonização do MST e da reforma agrária é uma manobra da ultradireita para atender a interesses da minoria em detrimento da maioria. Embora este processo tenha iniciado há tempo, é nesta eleição que esses usurpadores do poder depositam suas vidas em troca da vitória. Sim, somente no poder poderão atender os interesses de exclusão, concentração e restrição ao acesso. Neste contexo, é corrente a sugestão dos governos, especialmente da europa, para que os empresários de seus países invistam na compra de grandes extensões de terras na américa latina, especialmente no Brasil. O propósito disto é a produção de alimentos e a exploração da água. Efetivamente o MST é uma pedra no sapato deste processo. Assim, o que também está em jogo nesta eleição é a soberania territorial e alimentar.

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